26.8.07
11.8.07
O Governo antropofóbico
Vai grande escândalo na pátria por causa das criancinhas contratadas para fazerem de conta que eram alunos na sessão de apresentação do Plano Tecnológico da Educação. Não percebo porquê. Como sabe qualquer pessoa que tenha os filhos nas escolas públicas, estas não funcionam nesta época do ano, logo as criancinhas só por intervenção divina ou contratação terrena ali estariam.
Como bem respondeu à jornalista o rapaz que fazia de aluno: "Chamaram-me para uma publicidade e estou aqui agora." Esta criança é um analista de primeira linha porque na verdade definiu muito bem não apenas a sua situação mas também a nossa: chamaram-nos para uma publicidade e aqui estamos. Pois não sendo este Governo o primeiro que chama os portugueses para a publicidade, caracteriza-se pelo facto de não nos suportar em qualquer outra ocasião. Os únicos acontecimentos em que o Governo se sente à vontade são aquelas sessões em que nos garante que a nossa vida vai mudar radicalmente em consequência duma nova tecnologia para a qual o executivo nos vai mobilizar. Estes anúncios sucedem-se a uma velocidade tal que esquecemos rapidamente os anteriores. Por exemplo, onde param os dez milhões de caixas de correio electrónicas que os CTT lançaram em 2006 e que custariam a módica quantia de 2,5 milhões de euros?
Contudo, o quadro interactivo agora anunciado pelo Governo é muito mais patético do que a caixa electrónica que os interessados têm de activar através duns procedimentos contemporâneos do papel selado. É mais patético porque, ao escutar-se Sócrates a explicar as maravilhas do dito quadro, se percebe como ele acha que tudo se resume aos adereços. Ao contrário do que afirmou o nosso primeiro-ministro, a relação professor-aluno não muda por causa dum brinquedo que desenha de forma perfeita os ângulos dos losangos. O quadro interactivo não faz falta alguma ou melhor dizendo faz tanta falta quanto antes deles fizeram os ainda recentes acetatos ou já os desaparecidos flanelógrafos: se o professor for bom e se a turma estiver motivada, esses objectos ajudam a tornar mais interessante aquilo que já o é. Caso contrário, ou seja, se o professor for mau e se os alunos não estiverem interessados, então todas essas apregoadas maravilhas se transformam numa tralha grotesca.
Mais do que os edifícios e do que os equipamentos, as escolas são as pessoas. E não apenas os professores e os alunos. Por exemplo, muitas das mais graves agressões registadas nas escolas acontecem porque existem espaços e horários em que não se avista um funcionário, vulgo contínuo. Quando agora se anuncia a instalação de sistemas de alarme e de videovigilância nas escolas "para protecção externa e salvaguarda do investimento de que os estabelecimentos têm sido alvo", não faria mais sentido optar-se por reforçar a componente humana dessa vigilância? O principal objectivo da vigilância, acreditava eu, era a segurança dos alunos, professores e funcionários e só depois a dos equipamentos. Mas ao optar-se pela videovigilância e pelos sistemas de alarme opta-se claramente por defender o quadro elecrónico e não as pessoas.
A escola do futuro anunciada por Sócrates é um local onde as figuras de autoridade como o professor e os funcionários são cada vez mais menorizadas e substituídas, nas aulas, pelos quadros interactivos e, nos pátios, pelas câmaras de videovigilância. Esta escola é o resultado dum governo que sofre duma variante da antropofobia aplicada especialmente aos portugueses. Não há interactividade que nos valha.
Como bem respondeu à jornalista o rapaz que fazia de aluno: "Chamaram-me para uma publicidade e estou aqui agora." Esta criança é um analista de primeira linha porque na verdade definiu muito bem não apenas a sua situação mas também a nossa: chamaram-nos para uma publicidade e aqui estamos. Pois não sendo este Governo o primeiro que chama os portugueses para a publicidade, caracteriza-se pelo facto de não nos suportar em qualquer outra ocasião. Os únicos acontecimentos em que o Governo se sente à vontade são aquelas sessões em que nos garante que a nossa vida vai mudar radicalmente em consequência duma nova tecnologia para a qual o executivo nos vai mobilizar. Estes anúncios sucedem-se a uma velocidade tal que esquecemos rapidamente os anteriores. Por exemplo, onde param os dez milhões de caixas de correio electrónicas que os CTT lançaram em 2006 e que custariam a módica quantia de 2,5 milhões de euros?
Contudo, o quadro interactivo agora anunciado pelo Governo é muito mais patético do que a caixa electrónica que os interessados têm de activar através duns procedimentos contemporâneos do papel selado. É mais patético porque, ao escutar-se Sócrates a explicar as maravilhas do dito quadro, se percebe como ele acha que tudo se resume aos adereços. Ao contrário do que afirmou o nosso primeiro-ministro, a relação professor-aluno não muda por causa dum brinquedo que desenha de forma perfeita os ângulos dos losangos. O quadro interactivo não faz falta alguma ou melhor dizendo faz tanta falta quanto antes deles fizeram os ainda recentes acetatos ou já os desaparecidos flanelógrafos: se o professor for bom e se a turma estiver motivada, esses objectos ajudam a tornar mais interessante aquilo que já o é. Caso contrário, ou seja, se o professor for mau e se os alunos não estiverem interessados, então todas essas apregoadas maravilhas se transformam numa tralha grotesca.
Mais do que os edifícios e do que os equipamentos, as escolas são as pessoas. E não apenas os professores e os alunos. Por exemplo, muitas das mais graves agressões registadas nas escolas acontecem porque existem espaços e horários em que não se avista um funcionário, vulgo contínuo. Quando agora se anuncia a instalação de sistemas de alarme e de videovigilância nas escolas "para protecção externa e salvaguarda do investimento de que os estabelecimentos têm sido alvo", não faria mais sentido optar-se por reforçar a componente humana dessa vigilância? O principal objectivo da vigilância, acreditava eu, era a segurança dos alunos, professores e funcionários e só depois a dos equipamentos. Mas ao optar-se pela videovigilância e pelos sistemas de alarme opta-se claramente por defender o quadro elecrónico e não as pessoas.
A escola do futuro anunciada por Sócrates é um local onde as figuras de autoridade como o professor e os funcionários são cada vez mais menorizadas e substituídas, nas aulas, pelos quadros interactivos e, nos pátios, pelas câmaras de videovigilância. Esta escola é o resultado dum governo que sofre duma variante da antropofobia aplicada especialmente aos portugueses. Não há interactividade que nos valha.
Helena Matos
O SINISTRO SUCESSO DA REFORMA DECISIVA
Finalmente o Governo tem sucesso estrondoso numa das suas reformas. E é logo na mais influente. A realidade não tem sido benevolente para os ministros, com dificuldades, bloqueios, contestações, mas num tema o Executivo conseguiu os seus propósitos: o INE acaba de publicar os números da natalidade, revelando que no ano passado nasceram cerca de 105 mil crianças, menos que em qualquer ano anterior. Como grande parte desses são filhos de imigrantes, os valores portugueses são bastante inferiores.
O primeiro-ministro, modestamente, não reivindicou para si os méritos deste resultado, mas não há dúvida que se deve a uma estratégia longamente meditada e coerentemente aplicada durante décadas por vários governos. Não seria possível atingir valores tão miseráveis de natalidade sem esta intensa e persistente atitude política. Foi este Executivo que fechou maternidades, liberalizou e subsidia o aborto, impôs a educação sexual laxista. Ele é o herdeiro dos que facilitaram o divórcio, promoveram uniões de facto, promiscuidade, homossexualidade. Os portugueses estão em vias de extinção e José Sócrates pode gabar-se disso.
O valor agora revelado não é surpresa inesperada, mas vem na sequência natural de uma linha já antiga. Todos sabemos como a cultura progressista, manifestada por intelectuais, leis, telenovelas e programas educativos, se opõe à chamada "família tradicional". No antigo regime obscurantista a fertilidade portuguesa manteve altos valores, à volta de três nascimentos por mulher, até ao início da década de 70. Com a democracia e desenvolvimento começou a tendência moderna de queda da fertilidade.
Aqui Portugal não só conseguiu a convergência com a Europa, mas ultrapassou-a largamente. A nossa taxa de fertilidade de 1,36 nascimentos por mulher é bastante inferior à média da União Europeia (1,52), por sua vez muito menor que o nível de reposição das gerações de 2,1. Não se pode dizer que se trata de uma fatalidade sistémica, porque em países próximos os esforços atentos têm conseguido inverter a trajectória. Trata-se mesmo de uma específica estratégia nacional. O Governo português mostra decididamente à Europa o caminho para a decadência populacional.
Os detalhes dessa política estão claros no programa do actual Governo. Aí, no capítulo VI, "Famílias. Igualdade e Tolerância", as prioridades das "Novas políticas para as famílias" são o "Combate à violência doméstica", "Igualdade de género", "Uma política de verdade para a interrupção voluntária da gravidez" e "Política de não discriminação". A questão da natalidade está omissa, como todos os aspectos da família normal. Para o Governo, ela é só um cóio de brutalidade e discriminação que o despotismo iluminado dos burocratas deve corrigir.
O "sucesso" nesta reforma estrutural não é secundário, mas um dos elementos mais centrais da estratégia do Governo. Porque o nosso Executivo precisa de afirmar a sua identidade, visto a política económico-social ser tudo menos socialista. Isso, aliás, é um ponto a seu favor, porque as orientações económicas da sua doutrina há décadas que se mostraram um desastre. Mas enquanto adopta estratégias mercantilistas precisa de se expressar politicamente noutros campos. Os socialistas, que há décadas eram contra as empresas e mercados, agora revelam a sua pureza ideológica planeando a família.
Perante os números, o Governo fingiu-se surpreendido e incomodado, apressando-se a apresentar nova reforma; desta vez umas improvisadas "medidas de promoção da natalidade". Nos assuntos realmente importantes encomenda estudos, cria comissões, promove consultas públicas. Nestes temas "menores" envereda pela forma boçal de prometer uns trocos, que dão títulos nos jornais e em breve esquecerão a questão.
Naturalmente, não será por uns meses de abono e uns tempos de férias que alguém decidirá passar a ter mais filhos. Assim se desviam as culpas e, em breve, poderá continuar a estratégia de desmantelar a família. Ao menos nessa reforma estrutural o Governo até consegue o que quer.
O primeiro-ministro, modestamente, não reivindicou para si os méritos deste resultado, mas não há dúvida que se deve a uma estratégia longamente meditada e coerentemente aplicada durante décadas por vários governos. Não seria possível atingir valores tão miseráveis de natalidade sem esta intensa e persistente atitude política. Foi este Executivo que fechou maternidades, liberalizou e subsidia o aborto, impôs a educação sexual laxista. Ele é o herdeiro dos que facilitaram o divórcio, promoveram uniões de facto, promiscuidade, homossexualidade. Os portugueses estão em vias de extinção e José Sócrates pode gabar-se disso.
O valor agora revelado não é surpresa inesperada, mas vem na sequência natural de uma linha já antiga. Todos sabemos como a cultura progressista, manifestada por intelectuais, leis, telenovelas e programas educativos, se opõe à chamada "família tradicional". No antigo regime obscurantista a fertilidade portuguesa manteve altos valores, à volta de três nascimentos por mulher, até ao início da década de 70. Com a democracia e desenvolvimento começou a tendência moderna de queda da fertilidade.
Aqui Portugal não só conseguiu a convergência com a Europa, mas ultrapassou-a largamente. A nossa taxa de fertilidade de 1,36 nascimentos por mulher é bastante inferior à média da União Europeia (1,52), por sua vez muito menor que o nível de reposição das gerações de 2,1. Não se pode dizer que se trata de uma fatalidade sistémica, porque em países próximos os esforços atentos têm conseguido inverter a trajectória. Trata-se mesmo de uma específica estratégia nacional. O Governo português mostra decididamente à Europa o caminho para a decadência populacional.
Os detalhes dessa política estão claros no programa do actual Governo. Aí, no capítulo VI, "Famílias. Igualdade e Tolerância", as prioridades das "Novas políticas para as famílias" são o "Combate à violência doméstica", "Igualdade de género", "Uma política de verdade para a interrupção voluntária da gravidez" e "Política de não discriminação". A questão da natalidade está omissa, como todos os aspectos da família normal. Para o Governo, ela é só um cóio de brutalidade e discriminação que o despotismo iluminado dos burocratas deve corrigir.
O "sucesso" nesta reforma estrutural não é secundário, mas um dos elementos mais centrais da estratégia do Governo. Porque o nosso Executivo precisa de afirmar a sua identidade, visto a política económico-social ser tudo menos socialista. Isso, aliás, é um ponto a seu favor, porque as orientações económicas da sua doutrina há décadas que se mostraram um desastre. Mas enquanto adopta estratégias mercantilistas precisa de se expressar politicamente noutros campos. Os socialistas, que há décadas eram contra as empresas e mercados, agora revelam a sua pureza ideológica planeando a família.
Perante os números, o Governo fingiu-se surpreendido e incomodado, apressando-se a apresentar nova reforma; desta vez umas improvisadas "medidas de promoção da natalidade". Nos assuntos realmente importantes encomenda estudos, cria comissões, promove consultas públicas. Nestes temas "menores" envereda pela forma boçal de prometer uns trocos, que dão títulos nos jornais e em breve esquecerão a questão.
Naturalmente, não será por uns meses de abono e uns tempos de férias que alguém decidirá passar a ter mais filhos. Assim se desviam as culpas e, em breve, poderá continuar a estratégia de desmantelar a família. Ao menos nessa reforma estrutural o Governo até consegue o que quer.
João César das Neves
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